sábado, 9 de junho de 2018

GOSTO E MEMÓRIA OLFATIVA

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A impressão geral é de que o olfato é o nosso sentido mais frágil e subdesenvolvido, mas é justamente o contrário. Se por um lado o estímulo sensorial olfativo é o que mais demora a chegar ao cérebro, por outro ele é o mais percebido. Cada odor passa por mais de mil receptores nasais, cada um consistindo de milhões de células sensoriais, capazes de processar milhões de aromas (dez mil vezes mais do que o paladar). As informações são transportadas até o bulbo olfatório, que interage com o sistema límbico, que por sua vez está ligado aos comportamentos básicos do ser humano: alimentação, defesa, fuga, prazer e libido. Os cheiros que sentimos desde que nascemos são registrados pela amígdala (emoção) e hipocampo (aprendizagem). Os aromas de leite materno e talco de bebê, que têm, respectivamente, traços de baunilha e lavanda, geralmente agradam a todos por remeterem a cuidado e proteção. Porém, quando crescemos, episódios diferentes vão acontecendo a cada um e assim diferentes associações são criadas. Cloro de piscina, lápis recém-apontado, maquiagem, eucalipto, vela queimando, tabaco – cada um tem suas próprias associações com esses odores e, por isso, as pessoas gostam de perfumes diferentes e não há um único perfume que agrade todo mundo. A memória olfativa é a mais forte que existe, tanto que quando sofremos um episódio doloroso (rompimento de relação, crise no trabalho, morte na família) o perfume que usamos durante o ocorrido quase sempre passa a trazer más lembranças e até mal-estar físico. Felizmente o contrário também é válido – um perfume pode nos fazer reviver lembranças agradáveis.


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Ele pede pra ela escolher seu perfume, e ela pega sempre o mesmo.

-De novo? Escolhe outro!
-Mas é o que eu mais gosto.
-Você não conhece os outros, como pode saber?
-Eu te conheci com esse cheiro, então é o que eu mais gosto.

Toda lembrança tem um cheiro, e quando você sente ele outra vez, vai lembrar daquele lugar, daquela pessoa, daquelas férias e junto vem as emoções que você sentiu. E não vai poder fugir. Se o perfume dele entrar no metrô você vai olhar em volta procurando-o. Se você entrar num restaurante e sentir o cheiro daquele bolo que comeu na casa da vó, aos 5 anos, é capaz dos olhos se encherem de lágrimas e o peito de saudade.
Um cheiro pode ser toda uma cena, todo um ano, toda uma vida.

Memória é um processo complexo, que se desenvolve em camadas múltiplas e circuitos neuronais complexos. A simples evocação de memórias alteram-nas por filtros e conexões neuronais novas. Portanto, não existe memória “mais forte” ou “menos forte”!

Não obstante, há memórias “mais emocionais” e “menos emocionais”!

Um estudo realizado por uma neurocientista de Brown demonstrou que, diferente de memórias evocadas por estímulos táteis, visuais, e auditórias, as memórias olfativas apresentavam inequívocos componentes emocionais e afetivos.

Mais recentemente, neurocientistas de Israel demonstraram que estímulos olfativos são processados paralelamente no Hipocampo (responsável pelo armazenamento de memórias de longo prazo), enquanto memórias visuais e auditivas são processados inicialmente no Tálamo (responsável pela organização do tráfego de informações ao Córtex).

Como era de se esperar, estímulos negativos aumentavam significantemente a fixação e a evocação de memórias.

Por isso lembranças associadas a cheiros são tão “vívidas” e vêm tão “fácil”. O olfato estimula o “centro” de memória, enquanto outros sentidos são primeiramente processados no Córtex para depois se unirem no “centro” de memória.

Também por isso é mais fácil lembrar do cheiro de uma avó falecida (estímulos negativos, e.g. dor) ou de um ex-namorado importante.

Do ponto de vista evolutivo, odores ofereciam para nossos ancestrais muito distantes as melhores dicas sobre alimentos mais nutritivos e predadores mais perigosos. Os demais sensores evoluíram bem mais tarde, e receberam tratamento diferenciado.

Tudo isso parece muito menos romântico que o cheiro evocado por um primeiro beijo, ou uma primeira paixão, ou uma infância idílica. Contudo, pesquisas em terapias neuromoduladoras para recondicionamento prometem avanços para aflições disparas, desde obesidade, até um coração partido.

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